segunda-feira, 6 de julho de 2009

Por prazer, não por dever

Artigo de Zuenir Ventura, publicado em O Globo em 01/07/2009.

Os eventos literários como feiras, salões e bienais não vão sozinhos resolver esse problema, evidentemente. Mas associando o livro a um clima festivo (basta ver como as crianças nesses espaços o dessacralizam, transformando-o em brincadeira), eles contribuem pelo menos para mostrar que a leitura pode ser um prazer, mais que um dever.


As feiras de livros são uma saudável febre que está se alastrando pelo país como uma espécie de gripe do bem. São poucas as capitais ou cidades médias — e até pequenas — que não promovem a sua uma vez por ano. Agora mesmo, eu, que sou um feirante tão assíduo quanto Veríssimo, Carlos Heitor Cony e Fernando Moraes, acabo de vir de uma em Ribeirão Preto e já vou para outra em Paraty. A de São Paulo é a segunda maior a céu aberto do Brasil e uma das mais democráticas: é toda de graça; a outra, mais internacional e elitista, cobra ingresso para as palestras e é visitada por 30 mil pessoas. Aquela tem nove anos e esta, sete. Estive na primeira edição das duas, e pude acompanhar a evolução delas.

A de Ribeirão cresceu tanto que hoje é o principal evento cultural da cidade, atraindo em onze dias mais de 400 mil visitantes que se espremeram em 16 mil metros quadrados e entre mais de 70 estandes de livros. Misturando literatura e música, espetáculos e mesas redondas, a 9ª Feira ofereceu ao público cerca de 600 manifestações artísticas. De autores, compareceram Thiago de Melo, Moacyr Scliar, Milton Hatoum, Marina Colasanti, Laurentino Gomes, Marçal Aquino, José Miguel Wisnik, Muniz Sodré e mais cem outros.

À noite, de 20 mil a 30 mil pessoas se aglomeravam na praça principal para assistir aos shows. Foram 60 — de Paulinho da Viola, Adriana Calcanhoto, João Bosco, Toquinho e MPB-4, Vanessa da Mata, Maria Rita, Lenine, entre outros. No gênero, é certamente a maior oferta de atrações extraliterárias que existe. Conhecida até agora pela monocultura da cana de açúcar, Ribeirão Preto periga tornar-se famosa pela cultura dos livros.

Em um levantamento que acaba de realizar sobre os maiores eventos literários do país, a revista Exame concluiu que o mercado editorial e o número de leitores vêm crescendo. Em 2000 eram 26 milhões e já em 2007, mais de 60 milhões. Apesar do crescimento, porém, o Brasil ainda lê pouco, menos até do que a Colômbia, por exemplo, onde cada pessoa lê 2,4 livros não didáticos por ano, enquanto no Brasil apenas um pouco mais de um livro (1,3) é lido por pessoa. Nos EUA, o índice chega a 5,1 e na França, a invejáveis 7 exemplares.

Os eventos literários como feiras, salões e bienais não vão sozinhos resolver esse problema, evidentemente. Mas associando o livro a um clima festivo (basta ver como as crianças nesses espaços o dessacralizam, transformando-o em brincadeira), eles contribuem pelo menos para mostrar que a leitura pode ser um prazer, mais que um dever.

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